O fenômeno Marina na eleição presidencial brasileira

A maior surpresa das eleições presidenciais do Brasil foi o desempenho da candidata Marina Silva do Partido Verde (PV). A ex-ministra do Meio Ambiente conseguiu um resultado inesperado no pleito de 2010 ao abocanhar uma fatia de quase 20 por cento de eleitores e levar a disputa para o segundo turno. A ex-petista, que ironicamente também carrega um "Silva" como sobrenome, impediu a vitória, no primeiro turno, da candidata do presidente Lula, Dilma Rousseff, e adiou para 31 de outubro a escolha do chefe, ou da chefe, da mais populosa nação sulamericana.

O que tornou o “case” da candidata Mariana ainda mais interessante para os cientistas políticos é porque a vitória da candidata Dilma Rousseff sobre José Serra era tida como certa por analistas e estatísticos, porém os números não foram capazes de prever o fenômeno "Marina" que foi inspirado, em vários aspectos, na eleição de "Obama", seja pelo uso de redes sociais, do discurso pautado no eleitor jovem e no foco na chamada sustentabilidade. A rigor, Marina tirou muitos votos de Dilma—que contava com aprovação do governo do presidente Lula que beirava os 80 por cento.

Marina Silva era até pouco tempo desconhecida do grande público, pertence a um partido pequeno (PV), além de ser um quadro político formado no Acre, um dos mais distantes estados da federação que fica no extremo norte do país. Nessa eleição, entretanto, como disse na campanha, a candidata Marina "perdeu ganhando" e já está sendo cobiçada para manifestar seu apoio pelas duas maiores agremiações políticas do Brasil que já se revezam no poder arrogantemente há 16 anos—com duas gestões de Fernando Henrique Cardoso e Luíz Inácio Lula da Silva. Marina, de fato, conseguiu o que queria, balançar a hegemonia (PT-PSDB), e fez mais do que o esperado nessa primeira tentativa de chegar ao Palácio do Planalto.

História ela tem. Vinda de uma família pobre, assim como Lula, Marina se alfabetizou com 16 anos, formou-se em história e foi companheira de luta do líder ambientalista Chico Mendes. Nessa eleição, tornou-se a terceira via entre gigantes partidários e fez uma campanha que pode ser considerada exemplar do ponto de vista do marketing e da mobilização on-line.

Porém, o que os principais analistas ainda estão tentando entender é até que ponto a "onda verde" de Marina não foi ajudada pelo notável crescimento do segmento evangélico, que já representa 19 por cento da população brasileira. Isto porque além de ser oriunda das classes populares, negra, nortista e ex-empregada doméstica, Marina também é evangélica, identidade religiosa que cresce de sobremaneira na classes C e D e nas periferias do Brasil.

No caso dessa eleição, boatos na internet de que Dilma Rousseff fosse anti-cristã e a favor do casamento gay, provocaram uma onda convervadora anti-Dilma que rendeu bons frutos para Marina - que usou igrejas como palanque eleitoral.

Por outro lado, há também o caso de muitos eleitores progressistas, que sempre votaram no PT, mas que ficaram decepcionados com os casos de corrupção na gestão de Lula e buscaram uma nova alternativa ainda no campo centro-esquerda, no caso Marina. Para esses, Marina é a esperança da continuidade das políticas sociais do governo Lula, mas sem o ônus da corrupção.

A pergunta que fica agora é se no segundo turno Marina Silva apoiará a candidata Dilma do PT, com quem teve divergências séria sobre questões ambientais, ou o candidato José Serra (PSDB) ao qual teceu severas críticas durante anos tachando-o de conservador e neoliberal.

O quebra-cabeça não é fácil. Serra precisaria obter 85 por cento dos votos de Marina para virar o jogo eleitoral, já Dilma, precisa apenas de 20 por cento para se tornar uma das mulheres mais poderosa do mundo. Nos próximos dias os olhos da mídia estarão atentos para o pronunciamento daquela jovem senhora, de aparência frágil, que mostrou sua força numa eleição que parecia ter cartas marcadas. Nesse jogo
eleitoral vamos ver quem vai "ganhar ganhando".

* Paulo Rogério Nunes é blogger convidado do AmericasQuarterly.org. Ele é diretor do Instituto Mídia Étnica em Salvador, Brasil, e é um dos autores na edição de inverno de 2010 da revista Americas Quarterly.

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Publicado originalmente em: http://www.americasquarterly.org/node/1850/