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Neste longo texto, Filomeno Pina discute as relações inerentes à separação da Diáspora Guineense dum regime político vigente no País natal nos anos/70, a partir da independência do regime colonial Português. O autor irá discutir os aspectos psicológicos desse afastamento e as implicações sociais para a família guineense; atentando para uma critica a um oportunismo político.

A revolta recalcada e a separação da Diáspora Guineense dum regime político vigente no País natal nos anos/70 teve o seu início a partir da independência do regime colonial Português. Esta separação vista como fenómeno físico e psicológico de inibição e afastamento do País, teve os seus argumentos de acordo com a natureza e motivos implícitos/explícitos vivenciados por grande número de famílias guineenses, que perderam a sua estabilidade psicológica, material e social durante o período de readaptação ao regime pós-25 de Abril. Um facto social resultante da defesa do indivíduo perante a situação complexa em que se encontrava no ambiente da política que se vivia na época.

Muitos cidadãos abandonaram, por opção, o seu País para irem viver longe da Terra que os viu nascer, não resistindo às novas exigências “ideológicas”, às condições de vida impostas pelo regime novo regressado da Luta de Libertação Nacional e, sobretudo, pelo medo da mudança como fenómeno desconhecido que gera até falsas interpretações.

Note-se no entanto este aspecto paradoxal, de alguém que vai a “fugir” daquilo que gosta mais, ou seja, do seu próprio País, para sobreviver longe, com mais dignidade, não tendo que se rebaixar, ser subserviente ao poder político instalado, consentir abusos perante ameaças e represálias, por ter vivido no País com o regime colonial, estando rotulado com preconceitos xenófobos e tribalistas, por vezes, sendo vitima de baixa política, que não garantiu justiça social num sistema de regime político partidário de si altamente “blindado”, porque insensível, para a sociedade encontrada com a independência e sobretudo os Bissau-Guineense, neste regime frio e insensível às diferenças encontradas no Povo circundante, não aceitou todos, pois escolheu e separou filhos da mesma Mãe, numa altura que o Partido deveria demonstrar uma “maternidade” exemplar. Não aconteceu, os filhos rebeldes e feios, foram maltratados, presos, torturados, e ninguém ficou com dúvidas de que este “Pai”, regressado da luta, afinal vinha de certo modo perturbado emocional e politicamente, pronto para um ajuste de contas com um certo número de pessoas, era agressivo e mau. A esperança de uma mudança de comportamento morreu na praia, durante décadas, ninguém percebeu este diagnóstico, desta nossa sorte fatal de quarenta anos lutarmos apenas uns contra os outros, o que provocou um abandono progressivo do País.

Toda esta metamorfose crítica e de crises constantes, mal interpretadas pelo poder político, complicou ainda mais a pouca confiança existente no novo regime. Muita coisa era mal percebida no seio do Povo (por exemplo os fuzilamentos em que a comunidade local era obrigada a assistir), uma sociedade exposta perante um poder que manipulou e perseguiu politicamente tudo e todos, os potenciais adversários e não simpatizantes do regime de partido único na época. Um certo número desta sociedade que viu suas vidas declinar ética, social, moral e materialmente em pouco tempo, instalando-se o medo, gradualmente foi-se perdendo “confiança” política no novo regime, i. é, pouco tempo depois da independência, rotulados que estavam pelo regime, muitos partiram para sempre.

Situação relevante a anotar foi esta descriminação implantada pelo método selectivo de divisão entre os Guineenses com a conotação (revolucionário/simpatizante ou reaccionário/alienado) de bons e maus, em vez de trabalharmos todos juntos com determinação positiva para unir Guineenses, sem excepção, preferiram implantar manhas e manias políticas para dividir, com benefícios para uma minoria que conseguiu ascender despida, por vezes, de toda a afectividade de origem como pessoa, em substituição da família natural pela família “política” como prova de “amor” à ideologia do partido único. Veja-se hoje como muitos filhos da Guiné-Bissau passaram de promessas esperançadas num País novo e independente, para vítimas inocentes do mesmo regime político, ao qual juraram promessas, e pergunto porquê?

Alguns na sua grande maioria da “classe” media e média-alta guineenses, gente de bem e trabalhadora, com responsabilidades na manutenção e funcionamento do aparelho de Estado, foram levados a abandonar o barco, “fugiram” por pressões políticas tendenciosas, discriminatórias ou com ameaças por pressão psicológica, o que socialmente trouxe receio de uma convivência livre e espontânea que era habitual, fez muita gente que ama o seu País se separar dele, movida por um “divórcio” atípico (contra a vontade), induzidos à emigração forçada, para evitar o tratamento politico instalado.

Este sentimento discriminatório projectado na emigração é injusto e préconceituoso. Até hoje ainda se registam sinais de desconfiança, de parte a parte, entre Guineenses radicados no País em relação à Diáspora.

Quem reside no País não vê com bons olhos quem vive e trabalha fora, dando a ideia de se sentir “ameaçado”, existe uma preocupação velada quando o emigrante visita o seu País, em saber se é um regresso definitivo ou se é só para passar férias, o que causa um desconforto, parecendo que alguém quer ver o outro pelas costas, sendo um potencial “rival”, mais um na concorrência, talvez.

Certamente que não é generalizada, esta atitude, na sociedade Guineense, mas este ressentimento ganha notoriedade, mais nas fronteiras do campo profissional, e isto é muito mau, mau, porque estamos perante um complexo de rivalidade intelectual entre Guineenses, que afecta muito o nosso ritmo de desenvolvimento, na Guiné-Bissau, facto à vista de todos, pelo estado a que chegamos, sem uma política de reagrupamento de quadros Guineenses, o que levanta suspeitas, porque quem pode determinar esta acção politica são os que estão dentro e no poder, até hoje, nunca se mexeu nisto. Por isso há que investigar e analisar a retaguarda profissional fora do País. Afinal quem gosta disto no estado em que estamos? O Povo é que não camarada!

É bom lembrar que há uma perda gradual na quantidade de profissionais qualificados desde os anos /70 até hoje, este défice qualitativo e quantitativo registado a partir do abandono do País, por vários motivos, marcou definitivamente o atraso que se verifica hoje, portanto, estamos perante uma variável constante, derivada de condições materiais que potenciam e sublinham diferenças, pela negativa, na sociedade, que foram sublinhando este preconceito em relação ao Guineense que vive e trabalha fora do seu País, mas que é preciso mudar e todos juntos, reassumirmos uma Guinendade positiva.

Vitimas desta descriminação, transportam sequelas por reacção a este tratamento injusto e tendencioso, dado pelo regime político na altura, mantidos na linha limite que separa a Diáspora do País de origem e ainda, tratados como se fossem um zero à esquerda. Esta discriminação com efeito à distância, tem maltratado o estatuto do emigrante, até hoje, visto como um problema em vez de uma solução. Quando na realidade dos factos é, na verdade, uma solução positiva, embora secundarizada pela descriminação de que são vítimas. Há um complexo de separação irracional mantido até agora, embora hoje se verifique com menor incidência, por quem vive dentro do País. Hoje, já se respeita mais a imagem do emigrante, tanto do ponto de vista material, como social e cultural. É uma referência na sua família e não só, visto como um apoio vivo e participativo no plano da gestão e negócios da família, sobretudo em tempos de crise e na pobreza em que se encontram várias famílias, os que têm emigrantes sempre sentem as suas vidas apoiadas materialmente, como sabemos.

Há injustiças cometidas na interpretação do fenómeno da emigração, o emigrante, por vezes, não é compreendido, mas rotulado no seu próprio País por preconceitos contra a sua imagem material ou como Guineense que vive fora.

Por ironia da sorte, isto também acontece no País de emigração que o acolhe (por ex: se no estrangeiro Ele tira lugar aos nacionais de origem, no seu País natal, é porque regressou para tirar lugar ao irmão) causando sempre reacção menos boa da parte do emigrante, parecendo que o seu regresso ou chegada ao País de acolhimento está sempre carregado de suspeição. O que vem, por outro lado, confirmar a existência de um factor psicológico nesta “rejeição”, tanto no País natal como no de acolhimento, afinal todos olham com desconfiança para o emigrante, esse “contentor” de experiências humanas que nunca esquece os degraus que pisou para sair ou entrar do seu Pais ainda mais forte.

Não é fácil lidar com este fenómeno, antes pelo contrário, por isso emigrar é para os fortes, os determinados, com coragem, os que conseguem suplantar a solidão, a angústia de abdicar da família de origem, “comer o pão que o diabo amassou”, lutando para atingir os seus objectivos e colocar-se à frente, para conquistar um lugar ao sol com a sua competência, capacidade material, num País estrangeiro mas de acolhimento, para trabalhar, evoluir e prosperar com dignidade merecida, coisa que no próprio País não seria possível e, por isso saiu, é hoje emigrante com os olhos postos na Terra que deixou para trás.

Esta realidade discriminatória comportamental tem vindo a isolar a Diáspora Guineense, há décadas, do merecimento qualitativo por parte de um poder político, que nunca deu mostras objectivas de se preocupar com unir os filhos da Guiné-Bissau a partir de um pacote de medidas como projecto político, há nada neste contexto.

Senão vejamos, qualquer Presidente da Republica quando visita um País da sua relação diplomática, normalmente se reúne com a sua Comunidade na Diáspora, para se inteirar da sua situação social e de acolhimento, procurando saber se a relação institucional de cooperação entre Países neste âmbito está sendo cumprida. Pois então, no caso da Guiné-Bissau, nunca nada disso aconteceu, nunca nenhum Presidente Guineense honrou este contacto com a Diáspora, durante as centenas de visitas, ao longo de quarenta anos, e porquê perguntamos (há ou não há complexos, conflitos e descriminações entre uns e outros, não?), está até hoje sem resposta este capítulo da relação com o emigrante, desde a independência, os Camaradas Presidentes: Luís Cabral; Nino Vieira; Kumba Yála; Henrique Rosa; e, só não tenho a certeza se também, Camarada Presidente Malam Bacai Sanha, se alguma vez reuniu com a Diáspora Guineense nos Países que visitou, se aconteceu foi, por assim dizer, o único Chefe de Estado da República da Guiné-Bissau que o fez, como excepção à regra, com certeza. Isto faz acreditar na tese de rejeição aqui apontada, consciente ou inconscientemente, ela existe e é preciso eliminar este obstáculo na nossa sociedade.

Ainda por cima, por parte de um País que tem toda a necessidade de reunir a “prata” da Casa, não o conseguiu e nem conseguirá, sem primeiro acabar com este complexo de separação e descriminação dos filhos da Guiné-Bissau (dentro/fora).

Pense nisto, futuro Presidente da Guiné-Bissau, qualquer Ministério dos Negócios Estrangeiros tem trabalho “original” a fazer e de raiz, junto da Comunidade Guineense espalhada pelo mundo fora, penso. Não nos podemos dar ao luxo de menosprezar, ser mesquinhos, com a prata da Casa que se encontra espalhada pelo mundo. Primeiro de tudo, devemos colocar as pessoas (Guineenses) em primeiro plano, criando condições materiais com políticas objectivas para animizar situações de dificuldades de compreensão e entendimento nesta matéria, é tempo de ganharmos estatuto com a experiencia do emigrante, que detém um vasto conhecimento científico e tecnológico da sua experiência, sabedoria política e cultural, que transporta e detém como ferramenta de uso na emigração e, filtrarmos o que nos interessa. Não podemos perder mais tempo, hoje mais do que nunca, o País precisa de todos sem excepção. Precisamos de uma política clara, objectiva e aberta ao diálogo neste campo e noutros igualmente necessários, sem demagogias e outros complexos políticos desnecessários, é preciso olhar para todos os filhos da Guiné-Bissau com o mesmo OLHO, até prova em contrário.

Nostalgia e solidão fazem parte da memória avulsa centrada na Terra, recheada de crimes de sangue, abusos cometidos com total impunidade, quando se trata de “camaradas” do Partido como agressor, normalmente escapam à justiça, há dois pesos e duas medidas, mas também temos boas recordações, como a felicidade vivida com amor que ficou da Terra deixada para trás, que nunca esquece o emigrante. Esta separação angustiada da Diáspora, é uma realidade que se foi tornando cada vez mais complexa, exigente do ponto de vista sentimental, e difícil de resolver, perante dificuldade de adaptação sentimental do emigrante. Há outro obstáculo, o poder político e militar desde a independência, situações que exigiam especial sensibilidade humana, uma tolerância e engajamento gradual sem ferir a filosofia de base social Guineense, supostamente alicerçada na unidade nacional, unidade do Povo e suas aspirações de progresso e bem-estar social, que deixou de existir, com muita pena, mas, se o homem pode por que não mudar o que está mal? Pergunto.

Há falta de tranquilidade social e de políticas objectivas para segurança dos cidadãos, é preciso identificar factos e factores que têm causado divergência entre guineenses (fora/dentro) e resolvê-los, para que possamos todos viver juntos numa Guinendade positiva.

É velho e careca o que vou repetir, refiro políticos do núcleo duro do regime do PAIGC na época, eles não conseguiram navegar nestas águas turvas do pós-independência, na falta de ferramentas do reconhecimento social delicado, interpretaram menos bem alguns fenómenos sociais exigentes, para adaptação/readaptação perante mudanças que se impunham em quase tudo na época e, dos dois lados (Povo libertado e os libertadores) logo após a independência nacional. Contudo, qualquer independência trouxe sempre problemas, a nossa não foi excepção, mas é tempo de não continuarmos a chorar pelo leite derramado, avançarmos sem pestanejar, pois o Guineense é forte e corajoso, a história deste Povo o confirma, só haverá vitórias no futuro, acredito!

GUINEENSES; UNI-VOS!

Infelizmente, como resposta, constatamos que muita coisa correu mal e assistimos a derrotas internas entre políticos e militares sem o desejarmos, deu-se o nascimento de fantasmas, medos, perseguições e mortes (prisões, torturas e fuzilamentos) de figuras da sociedade civil, líderes da elite na comunidade. Pois não foi fácil para muitas famílias, que viram, no entanto, na emigração a única alternativa condigna para uma vida com Paz social, uma vida digna, mas noutra parte do mundo, que não a sua terra natal, abandonando o próprio país e deixando para trás o resto da família, Deus assim quis, “onde te sentires bem, é lá a tua terra” e assim tem sido na história da humanidade.

Com a independência, deu-se então o início da debandada progressiva de quadros técnicos Guineenses, que por arrastamento se alastrou às suas famílias, à medida que reuniam condições materiais, no País de acolhimento.

O País foi ficando sem uma quantidade significativa de “peças” fundamentais para reactivação e funcionamento normal do aparelho de Estado (tanto em qualidade como em quantidade), exigida para o desenvolvimento em curso no País. Esta realidade prejudicou muito o início do arranque da independência e continuou até hoje, sobretudo porque aqueles que asseguravam a máquina abandonaram, a substituição não se verificou por falta de pessoal qualificado, no exercício profissional.

Verificamos aqui com clareza esta evidência dos factos citados atrás, razão pela qual a doença do subdesenvolvimento vitimou o nosso País, a ponto do aparelho de Estado entrar em coma profundo, i. é, perante a fuga de quadros de modo progressivo, contudo, também não adiantou nada no sentido de mudança de rumo nas políticas, os líderes trataram “friamente” e com total desprezo esta situação real, em vez de criarem condições políticas de vinculação socioprofissional, menosprezaram quem saiu e continuou tudo na mesma, como se não fosse de extrema importância estudar a situação, na altura devida, analisar e adequar novas medidas e políticas de reequilíbrio/equilíbrio da gestão do pessoal administrativo, no sentido de travar uma morte-lenta na administração do Estado, afectando toda a sua dinâmica de desenvolvimento global do País.

Parece até que ninguém viu nada disto ainda, se ouviu ou falou-se parece mentira, mas nunca de um modo oficial viu-se na preocupação do Estado, percebemos então alguma leitura da elite política sobre este assunto óbvio e desgastante, se pensam não dizem ou não fazem nada para mudar as mentalidades, nesta matéria.

Tudo isto é realidade de factos passados no terreno, que conjugados, fundamentam a importância negativa deste afastamento compulsivo de Guineenses do País, em busca de vida e de felicidade possível pelas razões atrás citadas.

Razões essas, mais materiais do que políticas ou baseadas numa reacção a eventual comportamento militar negativo, na sociedade civil. Fazendo crer que, não obstante a derivação da má gestão politica deste regime político “jovem”, inexperiente em matéria governativa e institucional do aparelho de Estado, tudo junto, fez estagnar o País décadas mais tarde (um caldo entornado neste momento), encalhados na corrupção e políticas a nivelar por baixo, estamos todos metidos nisto, portanto, é salvar o único barco, Guineenses.

Penso que de facto o nosso grande problema na estagnação do País é ADMINISTRATIVO, é urgente uma reforma administrativa reparadora do aparelho de Estado da República da Guiné-Bissau, penso ainda que seja de facto o único método capaz de devolver uma relação de cultura institucional normalizada, devolver tranquilidade na relação de trabalho entre funcionários públicos e privados, para o País avançar.

Num período de seis anos, a partir de 1975/76, houve emigração significativa do pessoal técnico qualificado, que fez com que o País começasse a “mancar”, como já foi referido, adaptado a um ritmo mais lento, mas andando, embora com dificuldades, sobretudo nas áreas do funcionalismo público e tecnológico, na saúde e na educação, por falta de pessoal técnico com experiência no ramo, assistimos impotentes sem reconhecer este facto evidente, fingimos como se nada fosse e não podemos continuar, fingindo.

Só muito tarde se apercebeu desta proliferação e desgaste lento nesta matéria, invadindo o núcleo do Estado, na falta de competência técnica. Poucas possibilidades de manutenção do motor, dificuldade crucial, e cada vez mais difícil manter o Estado na rota acertada com os projectos do País, até que os “bons” se tornam escassos e, uma vez sem “ovos”, difícil é servir omeletas. Daí que, qualquer coisa como imitação é logo uma referência, muitos postos de elevada importância para o Estado foram geridos com pouco conhecimento, sobretudo na especialidade.

Sabemos bem que quando tiramos muitas vezes uma cópia a partir de fotocópias, com o desgaste natural deste “estímulo”, chegamos ao ponto de sacar uma folha em branco como cópia, é o exemplo disto, o impasse do nosso País no que concerne o seu projecto de desenvolvimento. Vemos um motor “parado” que anda e pára ciclicamente, até que apresenta um diagnóstico de debilidade, por ausência de estímulo positivo, uma inoperacionalidade resultante da desunião entre a “prata” da Casa a que chegamos, como coisas nossas, marcando passo com políticas a nivelar por baixo, só.

Difícil é recuperar este tempo perdido, mas é POSSÍVEL projectarmos para sair desta crise, voltar a rever os “originais” modelos de desenvolvimento sem complexos, enaltecendo tudo de bom que se fez até aqui, nestes quarenta anos de independência, tirarmos elações numa profunda reflexão, com a maturidade de quem apreendeu com os erros cometidos e está disposto a evitá-los, com consciência adquirida a partir de factos estudados e analisados.

O primeiro regime político de partido único penalizou forte e feio todo País, lidando mal com o convívio das ideias diferentes, na época, descriminou grupos com ideias diferentes das ideologias inspiradas na política de esquerda (Marxismos). Cedo conotaram como reaccionários aqueles que mais faziam lembrar os “tugas”, por dificuldades de adaptação à situação nova. Como também, e não tardou, viram nos Guineenses radicados fora do País, uma ameaça social e política para o normal funcionamento da sociedade Guineense.

Contra a Diáspora cultivaram (PAIGC) sentimentos de rejeição a partir deste conflito que trouxe desconfiança, retaliação, inveja deslocada e subjacentemente assumida na postura de Estado, pela agressividade gratuita explícita constatada no seu modo de actuação, com pouco fundamento racional e objectivo, que apenas baseado na crença política partidária ou “ideologia” do partido, o quero posso e mando vigorou como ”lei” sem obstáculos.

A “farda” de militância no PAIGC trouxe imediatamente o primeiro ciclo de oportunistas que manifestaram a sua simpatia pelo PAIGC, com muita dose de “graxa”, para serem aceites. Um ambiente que serviu para cimentar o carácter ou a falta dele, sobretudo na nossa juventude nos anos /70. Altura em que começaram a considerar também o emigrante dos anos/70, um potencial reaccionário e perigoso, na medida em que mais tarde traria de fora para dentro do País, os maus hábitos da ideologia imperialista, habituados que estariam no Ocidente Europeu e outros, a outras “liberdades” pouco recomendadas para a época que se vivia na Guiné-Bissau.

Este preconceito foi determinante, do ponto de vista selectivo (saber quem é quem) para se restabelecerem regras de aproximação/afastamento, registou com maior evidência e acentuação um poder insólito desta elite política governamental do PAIGC, que ao mesmo tempo, provocou profundas roturas na sociedade, descriminações e injustiças, levadas a cabo na comunidade pelos Senhores do poder instituído, que normalmente impunes, continuavam, perante a crítica social.

Com forte influência no aparelho administrativo em todo o território nacional, sentimos desde a independência da Republica da Guiné-Bissau até hoje, e ainda existe, embora muito menos nos últimos anos, esta praga chamada “desconfiança” nos que vêm de fora para dentro do País, o emigrante.

Uma descriminação “forçada” que persiste em não valorizar o EMIGRANTE Guineense, uma desconfiança e receio que predomina dentro do País, mas que no entanto aceitando o seu dinheiro, entrar na Terra, nas participações comerciais e empresariais. Aproveito lembrar que até hoje O EMIGRANTE NÃO VOTA nas eleições, não participa na escolha dos líderes eleitos no seu País.

Talvez uma ameaça para alguns bem instalados da “classe” média alta ou mais acima…, os que têm condição material que permite um nível de vida de excelente qualidade material sem limitações, para muitos destes, talvez alguns, querem esta fatia significativa de irmão emigrante a permanecer ausente, até no “papel” (voto).

O grande Povo vai tendo um familiar fora, alguns vão podendo manter uma janela aberta para o exterior, na esperança de verem chegar algo de que precisam, como produtos de primeira necessidade, medicamentos, mesadas/dinheiro vivo, etc.

O emigrante, no seu estatuto natural de autêntico bombeiro voluntário, salva vidas da família carenciada radicada no País natal, porque estando fora, é sempre aquele que mais pode, material e financeiramente, um pouco mais, uma esperança de muitos Guineenses, cansados e carenciados, dentro do território nacional, que vão vendo uma luz no fundo do túnel, contornando a lei da vida. Ele ajuda a manter pequenos negócios, para subsistência de milhares de famílias. Temos como exemplo as empresas rodoviárias (Táxis, Toca-toca e outros transportes de passageiros, etc.), criadas a partir de negócio de emigrantes e não só, e com sucesso no País.

É preciso acabar com certos e determinados complexos em relação aos emigrantes Guineenses no seu próprio País. Reconhecer a sua importância (material, financeira, técnica e cientifica) na sociedade Guineense no seu todo.

Unir os Guineenses sem excepção, em torno das suas capacidades intelectuais, culturais, sociais e políticas, espalhadas no mundo, avançar rumo ao progresso definitivo.

Este conflito deficitário teve a sua raiz fundamental como “veneno”, criando fantasma do medo inter-pessoal gerado, que por consequência, perverteu a cultura administrativa vigente na época, e herdada do regime colonial que tecnicamente foi mergulhando numa imparável inércia.

Na base de medo pessoal do confronto de ideias, de competências, da disputa material, intelectual, competências técnicas especializadas e outros, fomos promovendo uma cultura de receio do alargamento de condições de liberdades na sociedade. Cultivou-se a ideia de que os mais inteligentes são os que concordam connosco (o que é falso), logo se sou um líder, os meus amigos serão os mais parecidos com o “poder” institucional que represento, neste caso, na época, seriam os simpatizantes/militantes do PAIGC partido único, que progressivamente veio a instalar o caos em que o País se encontra, porque se confundiu militância com meritocracia nas escolhas e preferências para ocupação de cargos públicos (isto é apenas como um dos motivos, há mais).

Os lugares de chefia na sua totalidade passaram a ser determinantes, o estatuto de confiança política, isto, como é óbvio, descriminou muita gente por excesso de zelo, na determinação do grau de aproximação/afastamento do Partido. Bons quadros, gente competente, tecnocratas, funcionários com muita cultura administrativa, pessoas necessárias como peças fundamentais do aparelho de Estado, foram deixadas ao abandono, ao sol e à chuva, por “chefes” que não estavam preparados para a condução de um carro automático. Uma das razões porque hoje somos forçados a andar de “carro” com menor competência mecânica, sem capacidades para competir numa pista de auto-estrada de desenvolvimento sustentado que a Guiné-Bissau se propõe.

Situação triste é esta que conhecemos e já bateu no fundo, a Guiné-Bissau, que só deitados a um nível abaixo do chão e levantados de seguida, com o País no peito, com uma energia para além das nossas forças, é que podemos retomar com vantagem o tempo perdido, com motivação renovada, recuperar rapidamente as peças necessárias e arrancar com tudo o que de bem e do bom se fez até hoje no território nacional.

Com coragem, fronte erguida e rosto sereno, enfrentarmos unidos, as novas batalhas, sem perder tempo com vinganças, ajustes de contas, corrupção passiva/activa, injustiças oportunistas, cobranças difíceis ou crimes selectivos. Pensarmos positivamente na recuperação de estados de espírito das pessoas desmotivadas, para juntos e unidos acreditarmos como Guineenses capazes de unir tudo e todos, num enorme cordão do tamanho da Guiné-Bissau e avançarmos rumo a bom porto, resgatando as conquistas da Luta de Libertação Nacional, este legado de diamante em estado bruto ainda, e lapidar a partir de melhores projectos para servir o Povo. Sem vender no entanto a Mãe, trabalharmos o corpo com a delicadeza de um filho que ama o que é seu e de todos nós, a Mãe-Terra.

O sistema administrativo no futuro (hoje já vem tarde) exige uma reforma urgente e altamente selectiva no aparelho administrativo do Estado. Porque ao contrário do que se pensa, o problema principal da Guiné-Bissau, não são os militares ou os políticos, como os únicos a dar que falar. A meu ver é mais um problema disfuncional actuante através do modo de interacção institucional deficiente que temos no País, por influência negativa da corrupção que afectou o Estado e grande parte do seu aparelho administrativo, trata-se de um défice Administrativo e Democrático no País.

Posto isto, é de realçar que estamos perante um espaço focal da doença, onde reside o “cancro”, que ainda é tratável, penso e digo isto com convicção e fé, nada mais.

Uma das terapêuticas assenta na promoção da meritocracia na sociedade Guineense como prioridade, um modelo de selecção técnico e profissional, reconhecido como motor actualizado nas sociedades modernas e progressistas, onde a igualdade de direito entre os cidadãos não pode ser descorada, beliscada, por complexos nenhuns (de compadrio, cunhas e o recurso a mover influência de apelidos sonantes, etc.), devendo ser logo “destruídos”, para evitarmos novos focos da mesma doença, prolongar-se o atraso e a discriminação do homem pelo homem, na Guiné-Bissau.

Muitos sectores e instituições vão ter que fazer o mesmo, urgentemente, reformar, reassumir novos estados de desenvolvimento para não estagnar ou regredir. Não há que ter medo da mudança, ninguém morrerá por isso, ninguém vai ser abandonado em “combate”, como também ninguém com menos agilidade e competência na actualidade, podemos permitir “envelhecer” num lugar isolado, sentado à frente de um”volante”de um carro que conduz mal, por falta de actualização da sua capacidade de condução, nisto temos de mudar e todos concordamos.

Ninguém uma vez substituído vai ser abandonado na “estrada” do desenvolvimento, nunca, continuará dentro, junto com o novo motorista e no mesmo carro (sociedade), merecendo ser transportado sem vexames, descriminações ou outras formas de abuso de direito.

Damos o mérito a quem fez o que pôde e da maneira como bem sabia fazer, sem poupar esforços.

Dizia um poeta anónimo “os velhos sabem e não podem, os novos podem mas não sabem”, Eu aqui, proponho cruzarmos experiências de conhecimentos, para juntos continuarmos este longo caminho sem isolar os nossos “pais” dos “filhos” de forma descriminada, reunidos num mundo para “idosos” ou para os menos capazes e um outro, para o ditos “normais”, nunca faremos semelhante descriminação, penso, seremos capazes de cuidar dos nossos mais velhos com sempre nos ensinaram, acreditamos por isso apostamos na mudança e ponto final parágrafo.

Este respeito a que nos referimos não significa reconciliar por reconciliar e com o que está mal (o efeito paz podre), não é adoptarmos posturas hipócritas ou de bajulação perante o poder político, não é fingirmos não-ver ou ser “engraxadores”, também não é perdoar o imperdoável, não é consentir o retrocesso perante uma possibilidade contrária de evoluirmos positivamente, não é temos vergonha ou medo de dizer a verdade, doa a quem doer, não é branquear aspectos negativos da nossa cultura, não é ser ladrão em terra de cegos, não é ser bandido e defensor da corrupção no País, não é ser “polícia” política vivendo às custas da mentira e de esquemas da máfia instalada no poder, não é prestando mau serviço ao Povo, mas sim o inverso, é de facto, um assumir consciente do papel do cidadão na sociedade Guineense, como bom filho da Terra, prontos para o servir sem equivoco no exercício da cidadania, servir o Estado como pessoa de bem e nada mais, servir, só.

Aqui o respeito ou acto de respeitar, são o que vai permitir descobrir o melhor para nós (Povo), para o benefício de todos nós, respeitando as leis, a relação democrática e as instituições do Estado, sublinhar a liberdade de expressão e responsabilidade social do cidadão, tudo isto, como forma de melhorarmos a nossa conduta pessoal enquanto Guineenses e servidores do Estado, preservar pela imagem do País, dentro e fora do seu território nacional.

Posto isto, tenho a dizer e para terminar, que somos todos Guineenses, não vale a pena escolher onde não se deve, não é justo que o façam por oportunismo político ou outro, acabando por lesar o País, separando uns dos outros, que certamente beneficiaria com todos os seus filhos no mesmo colo “criativo” e de desenvolvimento sustentado, que tanto desejamos.

Aqui vos deixo mais um artigo de opinião/reflexão, num assunto sério que tem sido contornado evitando pôr o “dedo na ferida”…, mesmo que não o citem com referência do seu autor, ao menos, leiam analisando ponto por ponto, o interesse é comum e nosso, há vontade Guineense em ver tudo terminar com final feliz e unidos, nesta luta pela causa que é a Guiné-Bissau.

*Este texto foi originalmente publicado em http://www.didinho.org/DIASPORAFOBIAPROGRESSIVANAGB.htm, o objetivo do autor é que os leitores difundam e discutam o tema em questão amplamente.
**Por favor envie comentários para [email][email protected] ou comente on-line em http://www.pambazuka.org
***Filomeno Pina é Psicólogo clínico U.C.