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"Quer dizer, a grande vantagem de estarmos no Poder é que, para sermos empresários, não precisamos de empreender nada. A bem dizer, nem precisamos de empresas."

- Meu querido marido, escutou o noticiário?

- Não. Há novidades importantes?

- Diz o noticiário que você deixou de ser ministro.

- Afinal, eu ainda era ministro?

- Disseram que era. Não sabia?

- Tinha uma vaga ideia. Mas acho que se enganaram, também estes jornalistas divulgam cada coisa, sabe como é: jornalismo preguiçoso...

- Mas aquilo era um comunicado oficial. E disseram claramente o seu nome. Eu não fazia ideia. Pensei que era só empresário.

- Ai é? Saí no noticiário? Mostraram a minha foto?

- Não. Mas, diga-me lá, marido, você era Ministro de quê?

- Ministro dos Assuntos Gerais. Uma coisa assim... Já agora, você reparou se disseram quem era o novo ministro?

- É um dos anteriores vice-ministros.

- Afinal havia mais que um?

- Havia sete vice-ministros.

- Sete? Eh pá, aquilo não era um Ministério, era um Vice-Ministério.

- Fica triste, marido?

- Bom, pá, paciência. Mais importante são os meus cargos nas 15 grandes empresas.

- Ontem, no nosso jantar, você disse que eram 35...

- Minha querida, você escutou mal. Não há, no país inteiro, 35 grandes empresas. Aliás, a maior parte dos empresários de sucesso ainda anda à procura de empresas.

- Não entendo essa matemática.

- É que, no nosso país, há mais empresários que empresas.

- Trinta e cinco... Trinta e cinco são os nossos anos de casados. E estou tão orgulhosa de si, meu ex-ministro, você foi sempre tão ambicioso...

- Ambicioso, não. Ganancioso.

- E qual é a diferença?

- O ambicioso faz coisas. O ganancioso apropria-se das coisas já feitas por outros.

- Você apropriou-se de mim que fui feita por outros.

- Isso é verdade, cara esposa. Uma coisa é verdade: vai-me fazer falta o poder.

- O poder? Não me diga que lhe está faltar o poder, marido?

- Alto lá, falo apenas do poder político. Quer dizer, a grande vantagem de estarmos no Poder é que, para sermos empresários, não precisamos de empreender nada. A bem dizer, nem precisamos de empresas.

- Mas, marido, eu também tenho empresas, você diz que colocou uma data de empresas em meu nome.

- Tem razão, minha querida. Vou usar das minhas influências e pedir para você ser nomeada Ministra.

- Eu, Ministra? Para quê?

- Que é para, a partir da agora, você abrir empresas em meu nome.

*Mia Couto e literato moçambicano
*Cronica primeiro publicada em África 21, conteúdo gentilmente autorizado para reprodução no Pambazuka News