Foi lançada nesta quarta-feira(06) a estratégia de inclusão financeira de Moçambique, uma iniciativa do Banco Mundial com apoio da Holanda, que exclui as mulheres, os jovens e os agricultores moçambicanos numa clara contradição com o discurso do executivo de Filipe Nyusi que afirma estar “empenhado no desenvolvimento de medidas visando promover maior disponibilidade e acessibilidade de produtos e serviços financeiros de qualidade e adequados às necessidades da maioria da população moçambicana”.
“O Governo na sua estratégia de governação, está empenhado no desenvolvimento de medidas visando promover maior disponibilidade e acessibilidade de produtos e serviços financeiros de qualidade e adequados às necessidades da maioria da população moçambicana, incluindo pequenos agricultores e detentores de micro, pequenas e médias empresas, com maior enfoque nas zonas rurais”, declarou o ministro da Economia e Finanças, Adriano Maleiane, no acto de lançamento da estratégia, sem se referir a nenhuma acção específica, até 2022, no sentido de aumentar o número de mulheres ou jovens com acesso aos produtos e serviços financeiros bancários em Moçambique.
Nota-se também nas estatísticas o carácter excludente da estratégia devido ao reduzido impacto que se propõe, das actuais 12,6 por cento de moçambicanas adultas com acesso bancário o número deverá crescer para apenas 22 por cento em 2018 e 35,5 por cento até 2022, sabendo que as “mulheres contribuem para a poupança de uma forma mais eficiente no meio rural” disse na ocasião o Mark Lundell, o director do Banco Mundial em Moçambique, que salientou a existência de estudos que “mostram que as mulheres gerem e guardam de uma maneira mais eficiente” o dinheiro.
Os dados colhidos para a elaboração desta estratégia pelo Banco de Moçambique não se referem aos jovens e por isso esta camada, que representa bem mais do que a metade da população moçambicana, não aparece nos planos de acção de inclusão financeira.
Ministério da Agricultura excluído da estratégia de inclusão financeira
Relativamente à agricultura dita e repetida como “a base do desenvolvimento nacional” e que segundo a Constituição da República o “Estado garante e promove o desenvolvimento rural para a satisfação crescente e multiforme das necessidades do povo e o progresso económico e social do país” é dos sectores que menos crédito bancário tem recebido, apenas 2,5%, sendo grande parte destinado a empresas que produzem culturas de rendimento e não para a produção de comida, e a julgar pela estratégia os agricultores vão continuar sem acesso ao crédito bancário.
Num claro contra censo, até ao discurso ao Presidente Filipe Nyusi que tem enfatizado a necessidade de aumentar a produção para alcançarmos a auto-suficiência alimentar, a estratégia propõe-se a aumentar a proporção do crédito bancário a agricultura em apenas 1 por cento, até 2018, e em mais 1,5 por cento até 2022, quando se sabe que este é o sector que emprega a maioria dos moçambicanos, de forma precária diga-se.
Quiçá essa meta pouquíssimo ambiciosa se deva a exclusão do Ministério da Agricultura e Segurança Alimentar da estrutura de coordenação da estratégia nacional de inclusão financeira.
Micro, Pequenas e Médias Empresas vão continuar sem acesso ao crédito bancário
Outro sector que está nos discursos do Governo mas tem sido preterido nas acções práticas é do Turismo, agora colocado como prioridade de para o desenvolvimento de Moçambique, que recebe somente 2 por cento do crédito bancário.
A divergência entre as promessas e a realidade também é notável em relação às Micro, Pequenas e Médias Empresas (MPMEs). “O Governo continuará a adoptar medidas que estimulem o auto emprego e a criação e florescimento das micro, pequenas e médias empresas, por os considerar fundamentais para a complementaridade do processo de empregabilidade”, disse em Maio o Presidente Filipe Jacinto Nyusi, por ocasião da abertura da conferência nacional de validação do anteprojecto da política de emprego.
Mas as estatísticas mostram que apesar de todas medidas e estratégias em 41 anos as MPME´s, que representam 98 por cento do empresariado nacional, receberam somente 3,5 por cento de todo o crédito bancário que foi concedido à economia moçambicana. “(...) O elevado custo de financiamento e a limitação de recursos financeiros constitui um dos obstáculos ao desenvolvimento das MPME”, indica o diagnóstico realizado para a elaboração da estratégia ora lançada que no entanto não se propõe-se a inverter este cenário. A estratégia projecta que o crédito bancário para as Micro, Pequenas e Médias Empresas aumente somente em 1,5 por cento, nos próximos 2 anos, e em mais 2 por cento até 2022.
Banqueiros não estão interessados levar os seus bancos para onde está a maioria dos moçambicanos
“A maioria da população em Moçambique vive na área rural. No entanto, observa-se aí um baixo nível de oferta de potnos de acesso físico aos seviços financeiros nesta área”, constaram os estudo realizados para a elaboração da estratégia que também identificaram que dos mais de 14,1 milhões de moçambicanos em idade economicamente activa 9,2 milhões vivem nas zonas rurais onde apenas 10 por cento têm acesso aos produtos e serviços financeiros bancários existentes no nosso país.
Esta situação não deverá mudar muito até 2022 a julgar pela falta de acções realistas na estratégia lançada pelo Governo, com o apoio do Banco Mundial e do Governo da Holanda, e que foram trazidas à tona pelos banqueiros presentes no evento.
“(...)Corremos o risco de estar numa situação em que queremos expandir por decreto a disponibilidade dos serviços quando na verdade o mais importante é que essa expansão seja resultado da pressão da sociedade, dos cidadãos, das empresas para que esses serviços (bancários) existam porque existe dinheiro para pôr a circular por isso não está muito claro qual é o papel desta estratégia na expansão da produção”, questionou Salvador Namburete, antigo ministro da Energia que agora é presidente da subsidiária moçambicana do português Banco de Investimentos Global (BIG).
Outro banqueiro, antigo Governador do Banco de Moçambique, Prakash Ratilal, declarou que sobre “o tema de crédito principalmente nas zonas rurais nós temos que ir muito mais longe na sua reflexão porque o crédito pressupõe o risco do retorno, pressupõe a gestão. E a qualidade da gestão ao nível do que estamos a falar, principalmente nas zonas rurais, necessita de ser qualitativamente superior”.
“Não se trata de dar crédito em si, trata-se de saber se há retorno garantido para poder garantir que os depositantes que confiaram o seu dinheiro sejam reembolsados. E o tema das taxas de juros não é um tema de longo prazo só, mas há uma realidade que se impõe no dia-a-dia principalmente hoje quando estamos numa situação em que as empresas, por outras razões que não é a taxa de juro, se encontram em dificuldade aumentando o crédito vencido e complicam a vida do sistema financeiro” explicou e actual Presidente do Conselho de Administração do Moza banco que conclui que “Mesmo que estivéssemos numa situação normal o tema de financiamento rural, na agricultura em particular, é um tema que nos outros países não é feito apenas pela banca comercial, e isso temos que enfrentá-lo directamente”.
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