Os lucros e riquezas obtidos pela exploração dos recursos naturais do Congo Oriental continuam a alimentar a violência, a pilhagem e o sofrimento da população congolesa.
O território africano que abrange Uganda, Ruanda e a República Democrática do Congo (RDC) tem estado praticamente em guerra desde 1995. Mais precisamente num estado de guerra entre esses Estados. Isso desembocou em exércitos nacionais, milícias, grupos de “defesa civil”, pilhagens, saques e sequestros de crianças, estupros e assassinatos. Essas práticas não se excluem mutuamente, pois quase todas essas categorias contém a maior parte senão a totalidade das espécies de sociopatas. A esse contexto pode-se acrescentar as “forças de paz” das Nações Unidas cujas medidas de deficiências sociais refletem aquelas da população a qual supostamente deveriam manter em paz.
As guerras no Congo Oriental custaram a vida de milhões de congoleses que pagaram o preço de viver num país muito rico, onde todas as gestões são omissas com suas instituições civis em falência, quando estas existem. Essas guerras, concentradas principalmente no Congo Oriental (Norte e Sul de Kivu e Maniema), envolveram nove nações africanas e afetaram a vida de 50 milhões de congoleses.
Entre agosto de 1998 e abril de 2004 aproximadamente 3,8 milhões de pessoas perderam a vida por morte violenta na RDC. Depois de 2004 esta cifra quase dobrou. Boa parte desses mortos se deve à fome ou às doenças resultantes da guerra, bem como a execuções sumárias e à captura entre os grupos. Milhões de pessoas foram desterradas e procuraram asilo em países vizinhos. O estupro ocorria em toda a parte.
Desde 1996, a guerra e o genocídio da vizinha Ruanda transpuseram as fronteiras da RDC. As forças das milícias hutus de Ruanda (interahamwe) foram ajudadas por tropas francesas da Operação Turquesa para escapar de Ruanda. Isso permitiu a criação de campos de refugiados hutus na RDC repletos de fugitivos da Interahamwe. Não é de se surpreender que isso atraísse a atenção dos tutsis (os baniamulengues) na suposição de que esses campos hutus baseados na RDC não permitem ataques contra Ruanda.
Em outubro de 1996 as forças patrióticas ruandesas (FPR − as forças de Kagame) penetraram na RDC com uma coalisão armada liderada por Laurent Désiré Kabila, conhecida pelo nome de Aliança das Forças Democráticas Para a Libertação do Congo-Zaire (AFDL). Kabila foi colocado no poder após a destituição de Mobuto em maio de 1997. Ele se declarou Presidente, consolidou seu poder e o da AFDL e mudou o nome do país para República Democrática do Congo (RDC). Os militares da RDC foram renomeados Forças Armadas Congolesas (FAC). Enquanto as FAC sw reorganizavam, as tropas ruandesas cuidaram da segurança no Leste. Elas foram confrontadas então com diferentes milícias em competição:
– A milícias étnicas hutus dos interahamwe, originárias principalmente de Ruanda as quais combateram o governo dominado pelos tutsis em Ruanda;
– Os membros hutus das antigas Forças Armadas de Ruanda, considerados responsáveis pelo genocídio dos tutsis em 1994 e que também combateram o governo de Ruanda;
– Os mau mau, uma difusa organização de tradicionais forças de defesa congolesas que combateram o fluxo de migrantes ruandeses;
– The Alliance of Democratic Forces (ADF) [A Aliança das Forças Democráticas] composta de expatriados ugandeses e sustentada pelo governo do Sudão o qual combatia o governo de Uganda, E
– Vários grupos hutus em Burundi que combatiam o governo de Burundi dominado pelos tutsis.
Ao longo de 1997 as relações entre Kabila e seus antigos aliados (Museweni em Uganda e Kagame em Ruanda) se deterioraram. Em julho de 1998 Kabila ordenou a saída de todas as tropas estrangeiras em território da RDC. Elas, porém, recusaram sob o argumento de que as tropas congolesas eram incapazes de defender interesses dos antigos aliados ante os grupos de exilados que operavam no Congo Oriental. Em 2 de agosto de 1997 foram deflagrados combates em toda a RDA, encasião em que as antigas tropas ruandesas se “amotinaram” e novas tropas ruandesas e ugandesas entraram no Congo. Kagame mandou suas tropas atacarem Kinshassa a fim de destituir Kabila, na esperança de que seus aliados tutsis de Banyamulengue – novo grupo rebelde apoiado por Kigali e conhecido pelo nome deRassemblement Congolais pour la Démocratie (RCD) [União Congolesa pela Democracia] tomaria o poder. Pouco depois Museweni criou um grupo rebelde chamado Movimento pela Libertação do Congo (MLC) com o propósito de lutar pelos interesses de Uganda, e então enviou milhares de soldados ugandeses ao Congo. Essa campanha foi impedida por tropas angolanas, nanibianas e do Zimbabwe as quais intervieram em apoio à RDC.
No entanto esta situação deixou O Congo Oriental (onde acontecia a guerra) nas mãos dos ugandeses e ruandeses, caindo alguns setores também no controle dos mau mau e de Burundi. Isso gerou uma situação em que as forças de ocupação dispuseram de tempo para a pilhagem das riquezas do nacionais da RDC. Numerosos relatos e documentos atestam que, a partir de 1997, uma primeira onda de “novos homens de negócios”, falantes apenas do inglês do kinyaRuanda ou do kiswahili, iniciaram suas operações no Congo Oriental. O roubo de gado, de café em grãos e de outros recursos começou a ser relatado com frequência.
Quando, em agosto de1998, eclodiu aguerra, os oficiais superiores ruandeses e ugandeses e seus associados já possuíam profundo conhecimento sobre o potencial em recursos naturais, em especial do coltan [mistura de dois minerais: columbita e tantalita] e da sua localização na RDC.
A decisão ugandesa, tomada em agosto de 1998, de entrar em guerra era defendida pelos oficiais superiores veteranos do Congo Oriental durante a primeira guerra e que lá haviam calculado o potencial das riquezas. As forças ugandesas mostravam grande interesse em ocupar as regiões onde há ouro e diamentes. Em setembro de 1998 essa pilhagem foi atribuída ao irmão de Museweni, o general Salim Saleh (nascido em 14 de janeiro de 1960 com o nome de Caleb Afande Akandwanaho), homem ávido por dinheiro, traficante de drogas, ladrão e explorador. Salim Saleh criou uma companhia que transformaria a RDC Oriental num território de barganha pelos recursos naturais. O projeto jamais se materializou nesta forma, porém tornou-se uma pilhagem pura e simples com o beneplácito do presidente ugandês Yoweri Museweni.
Ainda que pretendessem demonstrar preocupação pelas questões de segurança na RDC, os oficiais superiores possuíam claramente uma agenda fechada no sentido econômico e financeiro. Alguns meses antes que a guerra eclodisse em 1998 o general Salim Saleh e o filho mais velho do presidente Museweni haviam visitado o Congo Oriental. Um mês após o início do conflito, o general James Kazini achava-se igualmente envolvido em atividades comerciais. Ele já conhecia os setores mais lucrativos e organizara imediatamente os comandantes locais para que servissem seus interesses econômicos e financeiros.
Ruanda não estava fora desse processo. O Banco do Comércio Desenvolvimento e Indústria (BCDI) sediado na capital Kigali funcionava como centro dos acordos financeiros. Esse era iniciamente o canal por onde fluíam todos os rendimentos ruandeses e ugandeses resultantes do engajamento desses países nas questões da RDC. Quando a guerra eclodiu, Ruanda conservou esse canal, enquanto Uganda fundava seu próprio sistema. Quando as hostilidades se iniciaram, a extração de minerais se acelerou, sem se levar em conta a segurança e os métodos racionais de extração.
Em setembro de 1999 o comandante local da UPDF exigiu a extração de ouro das galerias de Gorumbwa nas quais foi feito o uso de dinamite. A galeria demoronou causandoa morte de grande número de mineiros congoleses. Alguns meses mais tarde os soldados ugandeses, vindos para a exploração das minas, contraíram doenças respiratórias. Quando os comandantes locais foram informados sobre os perigos dessas atividades, eles estimaram que o número de mortos e doentes se situava em nível aceitável.
Durante anos os congoleses da região haviam praticado a mineração com métodos artesanais para o seu próprio benefício. A novidade dos novos métodos reside no fato de que agora muitos foram utilizados como “trabalhadores que se pode persuadir” para a extração de ouro, diamante e coltan. Na localidade de Bondo, na província de Equador, adolescentes e rapazes entre 12 e 18 anos foram recrutados pelo ex-vicepresidente Jean-Pierre Bemba. Os ugandeses aliados formaram os recrutas e fizeram com que estes compartilhassem a ideia de que o exército ugandês era um “exército de desenvolvimento” determinado a melhorar as condições de vida do cidadão comum. Após uma hora de exercícios físicos eles eram enviados às minas para extrair ouro em benefício dos ugandeses e de Bemba.
Em Kalima, o comandante Ruto da FPR arregimentou duas equipes locais de congoleses para a extração do coltan. Esses congoleses trabalhavam sob a guarda de soldados Ruandeses fortemente armados. No distrito noroeste de Kilo Moto, rico em minerais, os comandantes ugandeses da região e alguns dos soldados que vigiavam os diferentes pontos de entradas das minas permitiam e encorajavam a população local a extrair o minério. O trato entre os soldados e os mineiros era o de que cada mineiro entregaria um grama de ouro por dia na entrada/saída da mina. Em média cerca de dois milhões de pessoas aceitavam essa concessão seis dias por semana. Tratava-se de negócio bem organizado e que fluía sem atritos. Em média eram entregues 2 kg diários de ouro a pessoa que liderava essa rede [em cada mina].
Outra forma de extração organizada desse minério pelas forças de ocupação implicava na importação de mão-de-obra. As forças de ocupação recrutaram trabalhadores de seu próprio país, fornecendo segurança e logística. Ruanda, em particular, utilizou prisioneiros para a extração do coltan, em troca de redução de pena e de quantidade limitada de dinheiro para a alimentação. Só na região de Numbi de Kalehe, ao Sul de Kivu, trabalhavam nada menos do que 1.500 prisioneiros ruandeses. Esses detentos foram vistos na extração do coltan, sob a guarda de soldados ruandeses.
A exploração ilegal de recursos naturais não se restringia aos minerais e produtos agrícolas. Ela também revelava o viés das transações financeiras, das taxas (cambiais) e do emprego de mão-de-obra barata. Os bancos e as seguradoras locais de Goma, Bukavu, Kisangani, Bunie e Gbadolite encontravam-se em relação direta com Kigali ou Kampala. Um sistema de coleta de impostos – Forçado até o constrangimento em alguns casos – foi maquinado entre MLC, RCD-[ Acrônimo de Rassemblement Congolais pour la Démocratie = União Congolesa Pela Democracia]-ML e RDC-Goma junto a seus homônimos ugandeses e Ruandeses já estabelecidos. Segundo palavras dos rebeldes, essas taxas serviriam para “financiar ou sustentar o esforço de guerra”.
De fato parte dos fundos arrecadados era enviada a Kigali (no caso da RCD-Goma). No caso dos antigos RCD-ML e MLC, não somente uma parte das taxas era enviada a Kampala, mas também alguns coronéis tiravam proveito desse fluxo. Nas zonas de Búnia e de Bukavu a população protestou, fez manifestações e denunciou essa prática abusiva. Nas regiões controladas por Bemba, um camponês que transportasse óleo de palma na sua bicicleta deveria pagar uma taxa pela carga. No setor da extração mineral as coisas podiam acontecer de três maneiras: (a) taxas individuais para soldados para o próprio benefício, (b) taxas para as pessoas de região organizadas pelos comandantes Ruandeses e ugandeses e, (c) por cidadãos estrangeiros através da proteção do exército ou de um comandante.
Este foi o sistema de exploração da RDC referentes a seus recursos humanos e riquezas minerais apesar dos acordos de paz assinados em Lusaka, os quais deveriam findar guerra. Os exércitos beligerantes foram substituídos pelos senhores da guerra e pelas milícias cujo sistema de exploração assumiu a forma da pilhagem, do estupro e do assassinato. A maior parte desses grupos tem afinidades com os governos de Ruanda e de Uganda os quais gerem os aspectos físicos do marcado das riquezas exportadas. Ruanda sustentou “rebeldes” como os senhores de guerra Laurent Nkunda e Bosco Ntanganda. Estes foram os maquinadores da pilhagem contínua do Congo por Ruanda. Outros fazem o mesmo em Uganda. Eles operam em total impunidade.
Assim indivíduos responsáveis por atrocidades sem fim são protegidos. Dentre eles vale citar: Yoweri Museweni, Salim Saleh, Paul Kagame, James Kazini, Moses Ali, James Kabarebe, Taban Amin, Jean-Pierre Bemba, Laurent Nkunda, Bosco Ntanganda, Meles Zenawi, além de uma longa lista de pessoas cuja culpabilidade não deixa qualquer dúvida. Muitos dentre eles são reconhecidamente culpados por repetidas atrocidades. Bemba finalmente compareceu ante o TPI [Tribunal Penal Internacional]. Contudo a razão disso recai mais na sua oposição política a Kabila Junior e à Républica Centro Africana do que a seus desmandos no Congo Oriental.
Em teoria as Nações Unidas têm equipes pacificadoras na RDC, como é o caso da MONUC(Mission de l'Organisation de Nations Unies en République Démocratique du Congo [Missão da Organização das Nações Unidas na República Democrática do Congo]), as quais devem manter a paz. Após o 1º de julho de 2010 a MONUC foi renomeada Mission de l'Organisation des Nations Unies pour la Stabilisation em République Démocratique du Congo (MONUSCO [Missão das Nações Unidas para a Estabilização na República Democrática do Congo]). O saldo da MONUC não é dos mais impressionantes. Nas palavras de um general do Zimbabwe: “Eles são como tetas na barriga de um touro. Eles estão lá, mas não servem para nada!” As duas razões inerentes à sua falta de sucesso são as seguintes:
(1) no início eles contavam com a presença de militares franceses sediados na região do Ituri os quais recusavam deixar a cidade porque dois oficiais franceses haviam sido mortos por rebeldes já na primeira ronda,
(2) porque esses militares esperavam que as forças Ruandesas assumissem a coordenação da luta contra os rebeldes, em vez de apoiá-los sob o pretexto de ajudar a MUNUSCO. Esse programa não ofereceu maiores perspectivas aos congoleses. A bem do fato muitos “pacificadores” aderiram, por sua própria conta, aos estupros, pilhagem e assassinatos. Alguns foram sentenciados e repatriados. Sua presença na RDC aumenta o medo da população.
Enquanto esse conflito prossegue, o mundo volta seu olhar para outra batalha na região: a luta contra o Lord’s Resistence Army (LRA [Exército de Resistência do Senhor]). O LRA é uma organização ugandesa de reputação sanguinária. A reação do governo de Uganda tem sido igualmente brutal. Em setembro de 1996 o governo desse país implementou uma política de deportações forçadas da etnia acholi para campos de pessoas expatriadas no distrito de de Gulu. Depois de 1996 essa imposição se estende, englobando toda a população acholi de quatro distritos – um milhão de pessoas. Esses campos de deportados caracterizam-se por uma das mortalidades mais altas do mundo, com cerca de mil mortes por semana segundo estimativas. O LRA se apoderou da maior parte dos víveres dos acholis deportados, subjugados, expulsos de suas casas e cujas famílias vivem agora nos campos de deportados.
Joseph Kony (nascido em 1961) encabeça o Lord’Resistence Army. Ele declarou que o LRA conduzirá uma campanha política, militar e espiritual para o estabelecimento de um governo teocrático em Uganda, baseado nos dez Mandamentos. Essa milícia afirma que Deus lhe envia espíritos para comunicar diretamente a Kony a sua missão. O LRA adquiriu reputação de violência sem limites contra a população de várias nações, inclusas as de Uganda, RDC e Sudão. Estima-se que ele cooptou e forçou aproximadamente 60 mil crianças a combater a seu lado e que também forçou mais de dois milhões de pessoas ao êxodo após o início da rebelião em 1986. Entre 1996 e 2001 houve muitas tentativas internacionais em favor da paz e para interromper o rapto de crianças por estes radicais. Todas fracassaram no que tange à cessação dos raptos, estupros, bem como ao fim do uso de crianças como soldados e à violência contra civis, incluso os ataques aos campos de refugiados. Após o atentado de 11 de setembro, os Estados Unidos declararam o LRA um grupo terrorista e Joseph Kony um terrorista.
Após o fracasso das negociações de paz ao fim de 2008, o Conselho Nacional de Segurança norte-americano autorizou o AFRICOM (Comando Militar para a África) a apoiar operações militares contra o LRA (numa das primeiras operações do AFRICOM publicamente reconhecidas), onde presumivelmente essa milícia se encontre agora no Congo. O AFRICOM treinou as tropas nacionais e forneceu 1 milhão de dólares como manutenção financeira à “Operation Lightning Thunder” (Operação Relâmpago Trovão) – um esforço conjunto das forças ugandesas, congolesas e do Sudão do Sul em território congolês as quais lançaram uma operação em dezembro de 2008 visando “eliminar a ameaça representada pelo LRA”. De acordo com as Nações Unidas, essa operação ocorreu “sem avaliação do terreno no que concerne à proteção dos civis”. Após período de três meses a missão fracassou. O LRA se espalhou e exerceu represálias contra a população congolesa. Mais de mil pessoas foram assassinadas e mais de 200 mil deportadas.
Essa batalha contra o LRA deve ser vista como a continuação das batalhas no Congo Oriental. Em outubro de 2011, o Presidente norte-americano Barack Obama autorizou o deslocamenteo de uma centena de homens especializados das forças norte-americanas para a África Central. Elas ajudarão as forças regionais a retirar Jopeh Kony e seus tenentes “do campo de batalha. Ainda que as forças norte-americanas estejam equipadas para o combate, elas se limitarão a fornecer serviço de inteligência, conselhos e assistência às nações parceiras. Elas não se engajarão no combate com a LRA a menos no caso de situação de autodefesa”, afirmou Obama numa carta ao Congresso.
Não há dúvida de que o LRA é organização condenável, sociopata e praticante de comportamentos brutais. Entretanto as pessoas que articulam o combate contra o LRA (Yoweri Museweni e Paul Kagame) cometeram e continuam cometendo crimes igualmente graves e também ataques da natureza similar, especialmente contra os refugiados ao longo da fronteira do Congo Oriental. Todavia, pela prontidão em fornecer mercenários para a “guerra contra o terrorismo” e para a proteção das novas indústrias petrolíferas emergentes nos seus países e em toda a região, eles são até festejados e recompensados pelo governo norte-americano. Por infortúnio essa é a mesma região onde o LRA pratica suas atrocidades e precisamente onde foram descobertos novos e importantes lençóis petrolíferos.
O que motiva o interesse do Ocidente na região é a descoberta de petróleo nas bacias dos rios do Lago Albert no Quênia e em Uganda. A guerra entre o Sudão e o Sudão do Sul tornou imperativa a necessidade de se encontrar rota alternativa para canalizar o petróleo em direção aos portos do Oceano Índico visto que o oleoduto do Sudão é inacessível. Todas essas rotas passam através do território ocupado por contingentes do LRA (restam menos de 600 combatentes). Essa luta contra o LRA serviu de pretexto para que os Estados Unidos dessem continuidade à sua política de formar exércitos africanos de mercenários para prosseguir seu combate “ao terrorismo global” no Sudão, na Somália, no Iêmen e no Quênia. Os Estados Unidos fornecem armas, instrutores e meios de comunicação aos exércitos de Uganda e Ruanda para o combate contra o LRA e para a luta contra os inimigos dos norte-americanos na Somália. Lementavelmente isso permitiu aos ugandeses e aos Ruandeses o saque do Congo Oriental sob o pretexto do combata ao LRA.
Em 2009 a companhia Heritage Oil descobriu petróleo em Uganda. Descobertas subsequentes ocorreram também no Quênia. Em maio de 2012 esse país anunciava a descoberta de um segundo lençol petrolífero economicamente viável após mais dois meses de prospecção, bem como importantes reservas na remota região do Lago Vitória. O Quênia torna-se assim a última nação africana a se juntar ao grande boon petrolífero africano em seguimento às descobertas em Uganda e na RDC. Até Ruanda e Burundi aproveitarão esse maná, graças à East African Community (EAC [Comunidade do Leste Africano]).
A EAC pode contar com um futuro energético ainda melhor após as descobertas no Quênia, pois após as descobertas nesse país pode se acrescentar as reservas substanciais encontradas em Uganda e o gás natural localizado na Tanzânia. Existem igualmente explorações nas profundezas do Logo Kivu em Ruanda. O Sudão do Sul, com suas grandes reservas em petróleo, pleiteia tornar-se membro da EAC. Também na Somália foram localizados grandes campos petrolíferos e de gás natural.
A África é o principal continente do mundo na frequêcia de descobertas de reservas substanciais de petróleo e gás. Um relatório conjunto do Banco Africano de Desenvolvimento, da União Africana e do Fundo Africano de Desenvolvimento mostra que, ao final 1980, as reservas petrolíferas africanas aumentaram em mais de 25%, enquanto as de gás natural se elevaram em 100%.
Este “novo horizonte” petrolífero e gasífero atraiu os grandes tubarões da indústria petrolífera internacional como a Chevron, a Shell, a Exxon, a Total e os gigantes petrolíferos chineses. Os processos de extração e refinamento exigirão o gasto de verbas imensas, dinheiro este que os africanos não possuem. Existe uma simbiose entre as atividades dos “Big Oils” e a África. As grandes companhias petrolíferas possuem o dinheiro e a África tem o petróleo e o gás ainda não explorados e, é muito importante ressaltar, os militares para proteger os futuros investimentos.
Os Estados Unidos não contam com apoio público para o envio de tropas de combate para o leste e o centro da África. Esse país, todavia, dispõe do equipamento, das verbas e dos instrutores para a criação de uma força que age por [sua] procuração na região. Num caso desses o fato de ter um inimigo em comum, como o LRA, constitui um gancho oportuno para a vinculação de uma política comercial. O LRA não precisa ser forte. Ele deve ser considerado como algo inerentemente mau e totalmente fora de qualquer limite. E ele corresponde a tais critérios. Os interesses norte-americanos e as ambições militares de Uganda e Ruanda coicidem e seus dois exércitos recebem imensas verbas para agir por procuração para os norte-americanos. Museweni e Kagame são festejados no Ocidente apesar de suas atividades na República Democrática do Congo.
Esta política de pilhagem ilimitada no Congo Oriental, caracterizada pela constância da miséria, da pobreza, do medo e da violência pelos e contra os congoleses pode perdurar. Os congoleses voltam a formular a pergunta que Tiberius Gracchus fizera à Tribuna do Povo: “quis custodiet ipsos custodes? (“quem vai nos proteger dos nossos protetores?”)
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** O Dr. Gary J, Busch é um sindicalista internacional, um acadêmico, um homem de negócios e um consultor em questões políticas e comerciais. Texto traduzido do inglês para o francês por Elisabeth Nyffennegger, e do francês para o português por Attila Blacheyre.
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